― Expulso?! Como isso foi acontecer
Oliver?! ― indagava minha mãe.
― Eu já
disse: um duende entrou na sala e colocou o rato na bolsa da professora. Foi
o duende e não eu. ― concluí, tentando manter a seriedade.
Minha mãe é
uma pessoa calma e tranquila, se não fosse por isso talvez tivesse pulado em
meu pescoço por causa dessa história maluca que eu estava contando. Mas era a
mais pura verdade.
Seu nome é
Cristine Turner. Tem os cabelos escuros, iguais aos meus. Olhos cor de caramelo
além de uma aparência jovial para uma mulher de quarenta e dois anos. Ela
trabalha em um restaurante na Austin Street e passa pouco tempo em casa.
Casou-se
apenas uma vez ― com meu pai ―, depois que ele morreu não conseguiu manter um
relacionamento por mais de um mês. Eu gostaria que minha mãe encontrasse alguém
legal, mas nos últimos anos suas escolhas foram terríveis. Um deles era
extremamente tagarela. Você deve estar se perguntando: mas isso é um problema?
Torna-se um problema quando a pessoa fala cuspindo para todos os lados ― eu o
chamava de Jeff Chuvoso.
Moramos no Queens, na Forest Hills. Como disse antes, em uma casinha pequena, porém
confortável e acolhedora.
Minha mãe
continuava me olhando com aquela expressão de incredulidade.
― Você está
se ouvindo, Oliver Turner?! Duendes?! ― perguntou ela com as mãos na cintura.
Respirei
fundo, não acreditaram em mim na escola, por que ela acreditaria? Nem eu mesmo
levaria essa história a sério. Provavelmente estava ficando maluco.
― Desculpe,
mamãe ― falei baixando a cabeça.
Ela era
extremamente calma; ao invés de me dar uma bronca ou me castigar pelo ocorrido,
segurou minhas mãos e olhou dentro dos meus olhos.
― Ah querido,
vai dar tudo certo, encontraremos outra escola para você ― disse uma Cristine
Turner sorridente com sua voz acolhedora que transmitia paz.
― Obrigado
mãe. ― agradeci.
― Só esqueça
essa história de goblins... ― ela engasgou enquanto falava.
― De que?! ―
indaguei. ― Mas eu não falei nada sobre goblins.
Ela ficou
vermelha e, com os olhos arregalados, mudou rapidamente de assunto.
― Eu já disse,
querido, isso é loucura. Não pense nessas coisas. Er… Ahn… Agora eu preciso
que você vá até a feira e busque algumas verduras para mim. Ou você quer ficar
sem janta hoje? ― declarou ela praticamente me colocando para fora de casa.
― Mas...
TUM!
A porta se
fechou às minhas costas. Isso foi estranho.
***
A feira de Austin
Street era a umas oito quadras da minha casa. Durante o caminho, aquela
frase martelava em minha cabeça ― esqueça essa história de goblins ―, minha
mãe estava agindo de forma estranha e parecia estar escondendo algo de mim. Mas
não sei o que, e por quê.
A feira é um
lugar... como posso descrever? É uma mistura de mercado ao ar livre com apocalipse zumbi. As barracas ficam
organizadas nas suas calçadas da rua, formando um corredor de frutas e verduras
que está sempre repleto de gente correndo de lado para o outro ― o alvoroço é
tanto que realmente parece o fim do mundo. Os feirantes estão sempre gritando e
brigando pela atenção das pessoas. Na maioria das vezes é um caos, e o cheiro
de frutas podres é insuportável.
Enquanto
passava por entre os comerciantes, ouvi o som de um rádio que dava as notícias
do mundo todo, e uma delas me chamou a atenção:
Plantão urgente! O vulcão Kilauea, no
Hawaii, está agindo de forma estranha nos últimos dias, causando tremores nos
arredores da ilha. No momento, alguns vulcanólogos estão trabalhando no caso, mas
ainda não conseguem explicar a causa desse fenômeno. Eles afirmam, também, que
não é possível prever quando haverá uma erupção.
Por mais que
a notícia fosse aterradora, não pude deixar de lembrar das viagens de verão que
mamãe e eu fazíamos antigamente. Todos os anos, em suas férias, ela me levava
até San Diego, na Califórnia, onde passávamos ótimos momentos na nossa casa de
praia ― que depois de alguns anos precisou ser vendida para pagar as despesas.
Deixando de
lado meus devaneios, continuei a caminhar entre as diversas barracas do lugar.
Enquanto dois feirantes discutiam sobre quem viu o cliente primeiro, algo
chamou minha atenção, na verdade alguém
chamou minha atenção.
Um homem ―
pelo menos parecia um. Sua barraca estava a alguns metros, afastada das outras.
Ele parecia ser um pouco maior do que o normal. Tinha os olhos saltados e
vermelhos e um nariz muito grande. A cabeça era desprovida de cabelos, mas em
compensação, o resto do corpo parecia ser de um urso. No lugar de seus dentes,
exibia presas afiadas, que o deixava com o rosto semelhante ao de um javali. E
usava um avental escrito: Fruit Ninja.
Mas o que
mais me impressionava era que ele levantava quatro caixas ao mesmo tempo, cada
uma delas rotuladas com um adesivo de cem quilos ― estava carregando
quatrocentos quilos como se fossem quatrocentas gramas.
O mais
incrível era que ninguém, além de mim, parecia notar a aparência monstruosa
daquele sujeito e a sua força sobrenatural.
Aproximei-me
do super-homem com cara de javali, me esgueirando atrás de algumas
caixas para não chamar sua atenção, quando...
― Isso é
um orc, e é melhor você ficar bem longe dele! ― disse uma voz feminina no
meu ouvido, me dando o maior susto.
― Aaaah!
― gritei e rapidamente levei às mãos a boca para abafar o som.
Olhei para
trás, pronto para dar uma bronca, mas... ela era linda.
Tinha cabelos
loiros presos em um rabo de cavalo e olhos azuis da cor do mar. Seu corpo
lembrava o de uma amazona e seu olhar intimidava igual a uma. Usava uma blusa
preta, calça jeans e um tênis Converse.
― Caramba,
garota, o que foi isso?! ― falei com a mão no coração. ― Eu estava distraído e
você surge do nada falando no meu ouvido, quase tive um infarto aqui, sabia?
Ela sorriu e
falou:
― Desculpe,
não foi minha intenção assustá-lo.
― Tudo bem,
não foi nada. ― respondi olhando para o outro lado à procura do homem gigante que
eu estava espionando, mas não o encontrei. ― Ele desapareceu.
― Talvez
tenha se assustado com o seu grito ― disse a garota misteriosa, sorrindo.
Olhei para
ela estreitando os olhos ― muito engraçadinha. Você costuma
assustar as pessoas e depois debochar delas ou eu sou um caso especial?!
A menina
loira não respondeu, apenas estendeu a mão para me cumprimentar e disse:
― Prazer em
conhecê-lo, meu nome é Maia Miller. Vim de muito longe à sua procura, nosso
mundo está correndo um grande perigo e preciso de sua ajuda para salvá-lo.
Bem, ela
podia ser linda, mas certamente era desequilibrada.
― Er...
me desculpe, Maia, mas estou sem tempo para salvar o mundo hoje. Quem sabe outro
dia... ― virei as costas e comecei a andar rapidamente deixando ela para trás.
Minha vida
já é uma loucura, não preciso fazer amizade com uma garota pirada que quer
salvar o mundo comigo
― pensei.
****
Poucos
minutos depois, enquanto estava andando de volta para casa, vi uma pequena
criatura passar correndo pelo meio da rua.
Quase um
metro de altura, caminhava de forma estranha e era extremamente feio. Sim, era
o mesmo monstrinho que entrou na minha sala e fez com que eu fosse
expulso da escola.
Lembrei-me da
palavra: goblin, como minha mãe supostamente o chamou. Eu precisava
investigar e descobrir o que estava acontecendo.
Ele
provavelmente estava à procura de outro idiota ― infelizmente o anterior fui eu
― para fazer uma de suas brincadeiras estúpidas. O maldito chutou algumas latas
de lixo; botou fogo dentro da caixa de correio; tocou campainhas e correu. Tudo
isso sem perceber que estava sendo seguido ― era um vândalo em miniatura.
Depois de ativar o alarme de uma dezena de carros, a criaturinha caminhou até
uma casa abandonada, onde finalmente o encurralei.
― Olha quem
eu encontrei novamente. ― falei com escárnio. ― Agora você vai abrir a boca e
responder todas as minhas perguntas! ― o ameacei, socando a palma da mão.
Ele me
encarava da mesma forma que na sala de aula. Com uma expressão sarcástica no
rosto e um sorriso atormentador nos lábios.
― Ruuurh...
Ha, ha, ha, ha! ― grunhiu o monstrinho e começou a rir descontroladamente.
― O que é tão
engraçado?! ― perguntei sem entender.
― Ruurh...
Ruurh! ― continuou urrando o duende, mas dessa vez atirou um sapato velho
em minha direção.
― Aaai! Já
chega! ― gritei antes de me jogar sobre ele e tentar agarrá-lo, mas o pequeno
foi mais rápido de novo e facilmente desviou da minha investida.
O anão
continuava rindo e apontando para mim como se eu fosse um grande idiota, o que
me deixava ainda mais furioso. Que criatura irritante ― pensei.
Enquanto ele
esperneava de tanto rir, eu encontrei uma oportunidade e o agarrei pelas
orelhas.
― E agora,
sua coisa feia, vai fazer o quê? ― disse eu, me sentindo vitorioso e o
sacudindo de um lado para o outro.
Ele se
retorcia e guinchava tentando escapar.
― Por que não
está rindo agora, sua aberração?! ― perguntei confiante. Antes que eu pudesse
decidir o que fazer com o pequeno goblin, me vi cercado por mais seis deles... porém,
todos segurando porretes, facas e machados. Agora eram sete, e todos fortemente
armados.
― Ops...
― larguei a orelha do anão que eu segurava; ele caminhou desajeitado até os
outros e resmungou algumas coisas, apontando para mim.
― Ruuurh ―
urrou um deles em desaprovação.
― Acho que houve
um mal-entendido aqui, não é, gente?! ― tentei argumentar dando um passo para
trás.
― Ruuurh! Ruuurh!
― resmungou o duende que estava mais à frente do grupo.
― Aah...
Sabem quem vocês me lembram? Os sete anões ― falei, contando um por um. ― Como
está a Branca de Neve?!
― Ruuuuuuurrrrhh!
― urrou mais alto o mesmo goblin, balançando seu porrete de um jeito bem
ameaçador.
― Calma aí, Zangado.
Parece que vocês não gostam muito de conversar não é?!
Antes que ele
respondesse com outro grunhido estranho, eu virei as costas e saí correndo.
Agora
imaginem a cena: eu estava sendo perseguido pelos sete anões. Mas pelas armas
em suas mãos, certamente não queriam me oferecer moradia ou comida de graça.
Poucos metros
depois, um deles me alcançou e acertou com seu porrete nas minhas costas,
fazendo com que eu perdesse o equilíbrio e desabasse no meio do asfalto.
Não tinha
ninguém na rua, apenas eu e os sete anões assassinos.
Consegui me
desvencilhar do primeiro goblin que me segurava e voltei a correr. Mas esses diabinhos
eram rápidos e logo me alcançaram de novo. O Zangado me acertou com o
porrete nas pernas, o que me fez cair novamente.
Mas dessa vez
não consegui levantar a tempo. Saltou em minha direção um monstrinho com um
machado enorme ― maior que ele por sinal. Mas antes que pudesse me cortar ao
meio, uma flecha o atravessou, o transformando em uma nuvem de fumaça preta.
No mesmo
instante outro goblin que se preparava para me empalar com sua faca, foi
atravessado por uma flecha, virando fumaça igual seu companheiro. E assim
aconteceu com outro e outro.
Sobraram
apenas três, ― entre eles o maldito que aprontou comigo ― que se entreolharam,
viraram as costas e foram embora.
Eu estava
quase nocauteado e do chão pude ver a silhueta de alguém se aproximando.
Era Maia, a
garota misteriosa. Ela segurava um arco e nas costas carregava uma aljava cheia
de flechas.
― Será que poderia me ouvir agora, senhor teimoso?
Leia também no WATTPAD
ConversãoConversão EmoticonEmoticon